Não se sabe ao certo quando a nossa praça principal recebeu essa denominação. Tendo o eminente Cônego Honório José Saraiva falecido em 1904, supõe-se ter sido atribuído seu nome ao principal logradouro público de nossa cidade pelo Prefeito Municipal Lourenço Saraiva Barbosa, seu parente afim, e que governou em um primeiro mandato a cidade de 1925 a 1928, tendo sido ele o primeiro gestor eleito pelo voto direto dos altoenses. Alfredo Rosa, nosso primeiro Prefeito, foi nomeado pelo Governo do Piauí, sendo o Chefe do Executivo Municipal de 12.10.1922 a 31.12.1924.

Após muito vasculhar nas pesquisas que desenvolvo há mais de 25 anos e nos livros de atas da Câmara Municipal de Altos, vi que a mais antiga referência à Praça Cônego Honório Saraiva (este o seu nome oficial) se deu na sessão da Câmara do dia 14 de junho de 1948, quando o Padre Josino Borges Leal requereu ao Legislativo Altoense a doação de um terreno para a construção da Casa Paroquial de São José, no que foi prontamente atendido pelos vereadores de então.

A praça é usada no documento como referência territorial limítrofe do terreno cuja posse era pleiteada pelo citado sacerdote.

Já tendo sido palco de importantes eventos cívicos, religiosos e culturais da comunidade, a Praça Cônego Honório passou por várias remodelações e transformações ao longo dos anos. Inicialmente era apenas um largo arborizado e servia como lugar de passeio, descanso e também de local onde os feirantes prendiam seus animais enquanto iam comercializarseus produtos ou fazer suas compras no mercado central.

Foi ali que em 1953 o famoso Rei do Baião, Luiz Gonzaga (1912-1989) fez memorável show para deleite dos altoenses.

Show de Luiz Gonzaga em Altos

Registro colhido na 3ª edição do jornal O Altoense, do saudoso professor e historiador Chiquinho Cazuza (1938-2001), datado de outubro de 1987, página 04, dá conta desse significativo evento musical e cultural ocorrido em Altos, com o testemunho de quem presenciou aquele memorável acontecimento.

Segundo relato do cronista, a visita está entre os “dois acontecimentos que abalaram a monotonia da nossa cidade” em 1953, sendo este o “principal acontecimento artístico” daqueles tempos idos. O outro fato foi a visita da imagem peregrina de Nossa Senhora de Fátima a Altos.

O show do sanfoneiro aconteceu bem no meio no largo da praça da igreja matriz de São José (hoje Praça Cônego Honório), debaixo de uma velha mangueira, onde se improvisou um palco feito de caixotes vazios de cerveja.

Sendo um artista de renome nacional, o primeiro, talvez, que por aqui passava, a praça se tornou pequena para tantas pessoas. Diz-nos Chiquinho Cazuza que “havia gente até nos galhos das mangueiras”.


Largo da Praça da igreja matriz de São José, em Altos (foto de 1959), palco de realização do show artístico de Luiz Gonzaga em 1953.

Ali Gonzagão cantou e encantou a massa popular, que extasiada ouvia e dançava ao som de sua sanfona, zabumba e triângulo, instrumentos componentes dos conjuntos musicais da época.

“Após o show, o cantor e os componentes do conjunto dirigiram-se ao bar (Botequim do Chico Cazuza) para tomar coalhada. Depois foram à casa do Prefeito Anísio Lima (ali na Praça da Independência, onde residia seu filho, o falecido Delegado de Polícia, Carlos Lima). A população seguia atrás. Em casa do Prefeito, apesar dos pedidos, o sanfoneiro recusou-se a tocar ou a cantar qualquer número”. Assim afirma o relator do fato, que contava na época seus 15 anos de idade.

O então Prefeito Municipal, Anísio Ferreira Lima, contratante do artista, fez arrecadação entre os habitantes, pagando pelo contrato o valor de 4.000$000 (quatro contos de réis), custeados pelos fãs e admiradores de Luiz Gonzaga.

Certamente a comunidade altoense foi brindadacom muitos dos sucessos do Rei do Baião naquele memorável show, presenciado por vários contemporâneos e admiradores do talento invejável de Luiz Gonzaga, dentre os quais o grande sanfoneiro Libório Neto, já falecido.

Reformas 

Como é natural acontecer, a estrutura original da Praça Cônego Honório foi muito alterada no correr dos anos. Nos meus tempos de criança (fins de 1979 e início da década de 1980), era uma praça ajardinada, com passeios e bancos de cimento. Havia as 03 centenárias mangueiras na frente (hoje não mais existentes), onde hoje se pega os ônibus para Teresina e outros centros urbanos. Na lateral direita da praça, ao lado do calçadão, bem na quina que dá para a igreja matriz de São José, havia um enorme e frondoso pé de mulungu, daqueles de caroço grande. A gente pegava as sementes, de um vermelho brilhante e vivo, para fazer colagens em trabalhos escolares.

Logo mais ao centro, ficava um canteiro oitavado (08 lados), onde estava incrustada uma grande moeda de metal, que era o marco zero da nossa cidade. Esse canteiro foi, em tempos remotos, a base de um coreto, onde se apresentava a banda de música, se proferiam muitos discursos políticos e realizavam tertúlias dançantes e outras atividades socioculturais.O coreto era uma bela e monumental peça arquitetônica, e foi demolido na gestão do Prefeito Felipe José Mendes Raulino (Felipão), que governou a cidade de 1977 a 1983.


Professor Chiquinho Cazuza,
sentado no coreto da Praça
Cônego Honório, na década de 1950.

Ali próximo à parada dos ônibus, mais ou menos no meio da frente da praça, havia uma caixa de concreto com uma televisão, que servia de entretenimento para os passantes e também aos desprovidos desse recurso de comunicação em suas residências.


Sr. Pedro Tomé e sua esposa, D.Graça Clemente,
na Praça Cônego Honório, em março de 1983

Na quina da praça que dá para a Edifício Antônio Portella, por detrás da loja Marinheiro Construções, havia uma robusta caixa d’água, com formidável poço tubular que abastecia o comércio local e boa parte do centro da cidade. Infelizmente, na gestão do ex-Prefeito José Batista Fonsêca (Dr. Fonsêca: 1989-1992), foi demolida a caixa d’água, a caixa da televisão, aterrado o poço (o que trouxe sérias complicações de abastecimento à população) e foram totalmente modificados os passeios e bancos,construindo-se os jardins suspensos que sobreviveram até oinício do ano de 2018.

A reforma realizada na gestão do Prefeito Dr. Fonseca foi inauguradaem 12 de outubro de 1991, com a presença de várias autoridades e shows de poetas repentistas.

A atual gestão, na pessoa da Prefeita Municipal Patrícia Mara da Silva Leal Pinheiro (Patrícia Leal), empreendeu nova reforma e remodelação na Praça Cônego Honório, entregando à população na noite do dia 24 de dezembro do ano em curso de 2018 uma praça mais aconchegante e bonita, com passeios livres, bancos de cimento e madeira, boa e moderna iluminação e um lago artificial no centro do logradouro público.

Perfil biográfico do Cônego Honório

Honório José Saraiva erasacerdote católico, prócer político e abolicionista.Nasceu em Teresina-PI, a 10 de julho de 1852.Foi ordenado Padre na igreja Catedral de São Luís-MA em 1879. Ali atuou como Padre e depois Cônego.FoiVigário-Geral do Maranhão no Piauí.

Escrivão da Câmara Eclesiástica e Secretário do Bispado do Maranhão (1881), ao qual pertencia o território religioso do Piauí antes de sua elevação à categoria de Diocese autônoma.

No Maranhão, o Cônego Honório também exerceu o magistério, comoProfessor no Seminário daquele estado. Foi o terceiro Vigário-Geral forense da Província Eclesiástica do Piauí, desenvolvendo o sacerdócio na Paróquia de Nossa Senhora do Amparo, em Teresina-PI,de julho de 1883 a 1903.

Exerceu as funções públicas de Lente (Professor) de Pedagogia da Escola Normal do Piauí (1887) e de História Universal no Liceu Piauiense (nomeado por ato de 31.12.1891). Foi um dos organizadores do Partido Católico de Teresina (1890); líder do Partido Republicano Federal e do Partido Republicano Legalista (Teresina, 1892), do qual foi Vice-Presidente.

Graças a seu prestígio e dedicação, Altos ganhou o primeiro cemitério público (São José), em 1885; a primeira capela(de palha), dedicada a São José, em 1891; a primeira escola pública (Escola Mista de Altos), também em 1891; e a sua primeira igreja de alvenaria, em honra ao mesmo padroeiro, cuja pedra fundamental foi lançada em 13 de julho de 1901, de cuja obra ele pessoalmente se encarregou, contando com a ajuda material da população.

Acometido de lepra, padeceu longos anos de sofrimento. Ao descobrir que havia contraído a doença, pediu seu imediato afastamento das funções sacerdotais. No avançar dos anos e com o agravamento dos efeitos da hanseníase, por volta de 1903 o Cônego Honório passou a viver seus últimos dias de vida em completo isolamento no antigo povoado e hoje cidade de Altos, onde veio a falecer em 27 de janeiro de 1904, sendo sepultado dentro da inacabada igreja de São José, que ele vinha construindo desde 1901.

O túmulo deste eminente sacerdote fica no local onde hoje está edificado o Centro Pastoral Monsenhor Luiz Brasileiro, ao lado da igreja matriz de nossa cidade, marcado por uma laje de mármore.

A antiga lápide que assinalava o local de seu sepultamento foi localizada nas dependências da igreja matriz de São José, em Altos-PI, e está guardada na casa paroquial da citada igreja. A pedra original encontra-se incompleta e o seu restante está quebrado em dois pedaços. Dela se fez uma reconstrução em trabalhos de computação gráfica, com base em pesquisa dos caracteres componentes das inscrições nela contidas. A reconstituição foi realizada por mim e Antonio Costa, da empresa AC Vídeo Produções, de Altos-PI, no ano 2008, especialmente para o livro Na fé da minha Paróquia, de minha autoria, lançado no ano seguinte.

Tão logo o Bispo do Piauí,Dom Octaviano Pereira de Albuquerque, que governou a Diocese de 24.09.1914 a 02.11.1922, tomou conhecimento da causa-mortis do Cônego Honório, ordenou que fossem queimados alguns livros do arquivo da Paróquia do Amparo e do Bispado do Piauí por ele manuseados, vez que um morfético na época constituía-se numa séria ameaça à saúde pública.

O nome do Reverendo Cônego Honório batiza a praça central da cidade de Altos. A Lei Municipal nº 54, de 25 de abril de 1981, dá ao auditório que vinha sendo construído na administração do então prefeito Felipe Raulino (Felipão) o nome de Auditório Cônego Honório. Felipe Raulino, no entanto, deixou a Prefeitura sem concluir a obra, que levou na administração de José Gil Barbosa, seu sucessor(1983-1988), o nome de Auditório Alberto Barbosa, tornando sem efeito a lei anterior sancionada por aquele administrador.

Felipe Raulino, no entanto, deixou a Prefeitura sem concluir a obra, que levou na administração de José Gil Barbosa, seu sucessor (1983-1988), o nome de Auditório Alberto Barbosa, tornando sem efeito a lei anterior sancionada por aquele administrador.


Láp
ide reconstituída do túmulo do Cônego Honório
Fonte: livro Na fé da minha Paróquia, de Carlos Alberto Dias (2009)


Chiquinho Cazuza e amigos no coreto da
Praça Cônego Honório, na década de 1950


Aspecto da Praça Cônego Honório em 2018


Comércio informal na Praça Cônego Honório,
em 1995


Praça Cônego Honório em reforma empreendida
pelo Prefeito Dr. Fonsêca, no ano de 1991


Reforma da Praça Cônego Honório concluída em 2018 na gestão da Prefeita Patrícia Leal.


Foto: Luís Júnior

Por Carlos Dias - professor, historiador e escritor